A dupla Grenal promoveu um dos maiores embates que sua rivalidade centenária já presenciou, engendrou dois encontros belicosos com um saldo estratosférico de dez gols, esmigalhou o coração de cada torcedor vermelho, de cada torcedor azul, numa decisão por pênaltis alienígena, enfim, conduziu os mais ingênuos da província à crença de que a Libertadores estava superada, de que há futebol em quantia generosa por aqui, de que é possível confrontar os outros grandes brasileiros e conquistar, ao menos beliscar, a caneca de chope de Ricardo Teixeira que todos aceitamos como Campeonato Brasileiro. A dupla Grenal promoveu uma farsa. Não conseguiu vencer o time XY ou XX do Santos e quebrar o tabu na Vila. Não conseguiu nem um constrangedor empate no Olímpico, o que manteria a digna marca de não perder em estréias do torneio. O céu segue plúmbeo na terra de Túlio Milman. E a previsão não encomenda dias azuis ou vermelhos.
O quinhão mais vexatório dessa farsa gaudéria foi, sem dúvida, protagonizado pelo Grêmio, ontem à tarde. Há uma fidelidade inócua e perene mesmo no coração do torcedor mais reticente. Uma entidade que obriga essa criatura por vezes tão calejada de derrotas a dar demonstrações de amor pela camisa que escolheu, ainda que o momento recomende tapas, pontapés e outras agressões.
Pois essa fidelidade foi novamente maltratada pelos tricolores na derrota por2 a1 para o Corinthians. O jogo não diferiu daquilo que ocorreu nos cinco longos e derrotados meses de 2011 na Azenha. Um amontoado de jogadores de azul, preto e branco, em correria desabalada, inversões improvisadas, lançamentos apressados, tudo numa assimetria que confunde o adversário – na mesma proporção que confunde os próprios jogadores gremistas – e que, normalmente, contribui para o Grêmio marcar seus gols. Foi o que aconteceu quando Leandro, uma das poucas almas daquele time que não ardem num inferno imaginado por todo torcedor tricolor nesta segunda-feira, apossou-se da bola e marchou obstinado em direção à área paulistana, projetou-se sobre o gramado num roçar de ombros com o zagueiro e cavou o pênalti que Douglas configuraria em gol.
Mas todos sabíamos, lá no fundo, lá naquele recanto onde descansam as certezas que resistimos em admitir, todos sabíamos que o placar era um engodo. Quando o Grêmio de hoje sai vencedor, duas figuras fundamentais precisam estar em dia inspirado: Rockemback e Douglas. Ambos arrastavam-se em campo, errando passes simplórios e enredando a bola em movimentos inábeis até que ela os abandonasse em laterais ou desarmes adversários.
A virada corinthiana, gols de Chicão – noutro pênalti enganoso – e Liedon – aí está um centroavante de verdade – apenas confirmou as suspeitas de que há algo de muito podre na Azenha, de que não é normal um time que joga domingo começar a treinar na quinta-feira, de que, por fim e tragicamente, o Grêmio está colocando unanimidade que Renato Portaluppi forjou nos maiores títulosdo clube em atuações inverossímeis como jogador em cheque, vide os xingamentos e a revolta dos torcedores, anteriormente dedicados com exclusividade a jogadores e dirigentes.
Martírio na Vila
A Vila Belmiro é o terreno mais inóspito do Brasil para visitantes. Nalgum canto daquele gramado maldito onde Edson Arantes do Pelé, O Nascimento desfilou seu futebol monarca, deve residir a carcaça de um xangô macabro, os restos mortais de um bispo beatificado, a burca mágica de alguma entidade muçulmana, ou todos eles, mancomunados todos em ajudar o time de Santos.
Mesmo o Inter tendo um conjunto plural de talheres, não somente a faca – mas colheres e garfos para saborear Escargot e outros pratos de paladar exigentes – e o queijo nas mãos, emperrou novamente nas convicções européias de seu treinador. Numa partida de valor técnico reduzido, restou a Zé Roberto, dono do gol de empate colorado e de alguns bons lances individuais o protagonismo solitário. O Santos abrira o placar com um Keirrisson outrora pretendido pela Dupla Grenal, mas que desaprendeu a jogar futebol, de pênalti. O um a um melancólico persistiu.
É preciso ressaltar que Falcão ressentiu-se das ausências de Andrezinho, Indio, Rodrigo, Nei? e, sobretudo, D’Alessandro. O argentino fez muita falta num meio-campo combativo, mas previsível.
Resultados e Classificação aqui.
Guilherme Lessa Bica